Alvarinho da Páscoa, o que trazes pra mim?
Ideias do que beber no feriadão, Porto Ruby para seu ovo de chocolate, um podcast para ficar doidão e mais
Se tem uma uva que combina com a Páscoa é a Alvarinho (ou a Albariño). Já falei dela por aqui muitas vezes, mas nunca com um espaço mais dedicado. Chegou a hora, enfim, obrigada, bacalhau. A culpa é dele porque é a harmonização mais fácil e mais segura e mais maravilhosa que você vai alcançar. Hoje, tem Alvarinho (e Albariño, especialmente) de todo estilo, todo perfil, e vai dar para escolher o melhor deles para sua receita.
Começando pela origem, a Alvarinho é uma uva ibérica muito antiga, acreditam os cientistas, porque há grande diversidade morfológica. Apesar disso, os primeiros registros da uva são do século 19, ainda que tenham sido descobertas vinhas de 300 anos.
Não dá para dizer se a variedade é portuguesa ou espanhola porque está disseminada na região que vai do noroeste de Portugal até a Galícia, na Espanha. É uma uva com muita acidez e tamanho potencial de envelhecimento que eu acabei de ter a ideia de batizá-la de Riesling Ibérica (desculpem aí os mais nerdolas se eu os ofendo). Nos meus primeiros anos de profissional do vinho, fiz uma degustação vertical (o mesmo vinho, diferentes safras) de Alvarinhos de Monção e Melgaço, o lugar onde ela atinge seu ápice de qualidade em Portugal, em que provamos esses brancos elegantes com até três décadas de vida. Estavam belíssimos e muito vivos. Da região, há o clássico Deu La Deu e os maravilhosos vinhos Soalheiro. Deles, recomendo o bom preço do Allo, que traz a cepa num blend com a Loureiro. E, claro, há a Dona Paterna, que não poderia ter nome mais maluco para um vinho tão elegante.
Os vinhos feitos com Alvarinho podem ser leves, mas com uma estrutura firme, têm acidez muito aguda e trazem aromas cítricos e florais no geral. Estão muito em gosto porque são dotados também daquela salinidade tão festejada hoje em dia (peço perdão mais uma vez, agora por botar pilha na tendência, mea culpa!), o que os faz perfeitos para acompanhar peixes e frutos do mar. Na Galícia, são mais encorpados e ganham notas incríveis de pera — a depender do vinho, é fechar os olhos, respirar profundamente e se confundir: será mesmo vinho ou é um doce suco dessa outra fruta? Nessa linha, há o Vionta, que tem bom custo-benefício e que conheci (e de quem abusei) in loco, como provam as fotos abaixo.



Há algumas décadas, a casta passou a ser produzida também no Uruguai. Uma família originária da Galícia, os Bouza, foi pioneira em plantar a variedade pertinho de Montevideo, e começou a fazer vinhos maravilhosos. Isso abriu a porta para a Albariño do novo mundo e eu diria, sem medo, que hoje ela é a uva branca mais interessante do nosso vizinho. É muito comum encontrar nos supermercados o Albariño da Garzón, que é mais robusto e que traz um gostinho maravilhoso de mar, afinal, está ali pertinho, em Maldonado. O dos Pisano, Cisplatino, é delicioso também, merece todo o meu respeito (e saliva).
Neste ano, no lançamento do Guia Descorchados, aquele que reúne a produção dos vinhos da América do Sul, provamos dois varietais desta casta produzidos na região. Além de um rótulo dos tradicionais Bouza, o impecável Parcela Única B29 Albariño 2024, degustei meu primeiro chileno, feito no Vale de Aconcagua, o Montes Outer Limits Albariño 2024. Me deu alegria e uma previsão otimista de que ainda vou beber muito vinho bom, salgadinho, com nota de pera, de tangerina, de limão siciliano, por aqui. Os dois ainda não estão no Brasil.
Se, para esta Páscoa, você ainda está sem saber no que investir, eu diria para correr para a letra A, ou para as prateleiras de Espanha, Portugal ou Uruguai. Esses vinhos vão casar bem com peixes brancos e mesmo outros mais gordos, afinal, a harmonização também se faz por contraste, e a acidez do vinho ajuda a cortar a gordura do peixe. Por isso mesmo, imagine uma tacinha dessas com um bolinho de bacalhau, ou com crustáceos, ou com um prato principal deste peixe nórdico-ibérico: imagine que loucura que vai ser o salzinho que vai grudar na sua boca. Que sede, já estou pronta para mais um gole.
Bacalhau: tinto ou branco?
A pergunta de um milhão de escudos portugueses foi respondida na coluna que publiquei no início desta semana na Folha. Spoiler: dá para abrir um ou outro (ou os dois), dependendo dos temperos, acompanhamentos e cocção. Aqui você tem o texto completo.
Já para a sobremesa…
Se você é um louco chocólatra e quer investir em vinho para o seu Ovo de Páscoa, a tradição pede que a sua geladeira guarde um vinho do Porto Ruby por pelo menos 40 minutos, pra que na hora H ele esteja geladinho. Aqui no Brasil, a gente toma Porto como se fosse licor, em copinho baixo, à temperatura ambiente. Não poderíamos errar mais: a ideia é que ele seja consumido gelado para que fique mais equilibrado. E, como os Ruby têm aromas de uma fruta muito madura e exuberante, uma tacinha vai ajudar o seu nariz a aproveitar essa festa. Casas como Taylor's, Graham's e Ferreira fazem vinhos deliciosos.
Mais comida igual
A última edição rendeu muita conversa boa. Nos comentários e também por e-mail, gente da área e consumidores apaixonados lembraram da importância dos rankings de melhores do mundo na padronização que vemos hoje na comida. O 50 Best cresceu muito em todo o mundo e toda publicação (até esta, cof) tem um prêmio próprio para chamar de seu. Entrar numa lista dessas, ganhar um prêmio desses, é ter um selo de qualidade que convence o consumidor mais facilmente a experimentar. Quem ficou de fora, vai seguir quem entrou, e o resto não é história, mas exatamente o que estamos vendo por aí.
O restaurante é bom ou só lindo?
O New York Times trouxe essa discussão, que também está colada à edição anterior porque tem a ver com imagem, mas dessa vez do conjunto inteiro. Eu tendo a achar que os lyndos de verdade (aqueles que pensam em tudo e não só os chiques) são também gostosos. Seria eu uma grande poliana?
Degustação vertical
Bianca Veratti, uma das melhores professoras de vinho que tive, vai promover uma degustação de Quinta da Leda, um vinho ícone do Douro que homenageia o local de onde saem as uvas do Barca Velha. As safras são: 2018, 2019, 2020 e 2021. A ideia é analisar nuances do clima, decisões de vinificação e evolução em garrafa. Será em São Paulo, no seu espaço Vitis Lab. Informações e inscrições no (11) 99137-4494.
Para ouvir
Muita coisa é interessante aqui neste podcast, que tem o grande Mark Bittman como coapresentador, ao lado da filha Kate. Mas vou dizer apenas que a entrevistada da vez tem um livro sobre comidas feitas com cannabis. São 40 minutinhos, o que dá pra você ouvir dando um tapa (tsss…) na cozinha.
Bocaditos
- Eu, como Julia Child, já chorei porque amei uma comida — e também porque já fui infeliz. Esse vídeo é lindo e essa sobremesa parece realmente uma loucura!
- Quero muito comer essa salada de inverno, que não é para qualquer um porque tem erva doce como base. Mas parece muito aromática e ao mesmo tempo cabeça e deliciosa.
Já voltou no Domo?




Eu fui entusiasta de primeira hora do Dōmo Bar, na Santa Cecília, em São Paulo. Gostei demais da comida, que puxa para o lado asiático da força. Mas com tanto lugar abrindo em São Paulo toda semana, rola um desejo (que muitas vezes se prova equivocado) de sempre experimentar algo novo. Isso fez com que eu demorasse a voltar ao restaurante, que passou por mudanças na cozinha, mas sem perder o sotaque misto (japonês, chinês, coreano…). Tive ótimas surpresas, como o yakitori de coração e mexilhão e o tigre que chora, um corte de wagyu em marinada com salada de ervas e molho de tamarindo. Mas a melhor surpresa foi a Amanda Beserra (com S mesmo!), ex-Sede 261, que assumiu os vinhos da casa e me mostrou coisas maravilhosas como o Tokaj seco Sauska 2020, um trampolim para a dupla de ostras com ponzu e com granita de lichia brilharem muito. Depois, perdi a cabeça com o espumante X Bulles. Os dois fazem parte da nova carta rotativa mensal, que vai ter dez rótulos por mês, além de umas coisinhas que ela vai oferecer em taça por fora da carta. É uma boa senha para atrair os doidos do vinho. Ah, e para os doidos da sobremesa, tem opção com fruta e com creme, para abraçar todas as formigas e não apenas a chocólatras.






Só mais um golinho
Todos os dias, uma montanha-russa de emoções.
Alvarinho 🤍
O Oba tem algumas opções razoáveis que sempre estão em promoção, abaixo dos 70 reais.
Prefiro Pisano, Bouza e Soalheiro, mas meu bolso teima em não concordar comigo, então sempre busco por essas alternativas.
Um dos melhores vinhos da uva alvarinho que eu já provei, foi da Hermann. Vale a pena conhecer.